O Peso Invisível

Com o tempo, Isadora aprendeu a consolar, resolver problemas, esconder o medo, e nunca pedir nada. Achava que era seu dever “cuidar de todo mundo”. Ela não percebia que, enquanto era a “fortaleza” da mãe, ninguém era fortaleza para ela.

TEXTOS - BEATRIZ GOMES

Beatriz Gomes

5/8/20241 min read

woman in black and white crew neck t-shirt standing near lake during daytime
woman in black and white crew neck t-shirt standing near lake during daytime

sadora tinha apenas 9 anos quando começou a entender que sua infância era diferente da das outras crianças.

Enquanto suas amigas brincavam no parquinho depois da escola, Isadora corria para casa. Não porque queria, mas porque sabia que sua mãe estaria deitada no sofá, chorando, como sempre fazia desde que o pai as deixara. A menina tirava os sapatos em silêncio, pegava um copo de água, colocava ao lado da mãe e dizia:

— “Vai ficar tudo bem, tá? Eu tô aqui.”

À noite, Isadora preparava o jantar: arroz simples e ovo mexido. Cuidava do irmãozinho de 3 anos, dava banho nele e o colocava para dormir. Depois sentava na beira da cama da mãe, ouvindo desabafos que nem compreendia:

— “Você é minha força, Isa. Sem você eu não aguentava.”

Com o tempo, Isadora aprendeu a consolar, resolver problemas, esconder o medo, e nunca pedir nada. Achava que era seu dever “cuidar de todo mundo”. Ela não percebia que, enquanto era a “fortaleza” da mãe, ninguém era fortaleza para ela.

Na escola, era chamada de “madura para a idade”. Os professores elogiavam sua responsabilidade, sem saber que isso nascia de uma urgência emocional, não de escolha.

Ela não era madura: estava exausta.

Aos 16 anos, Isadora já fazia compras, pagava contas, faltava à aula para levar o irmão ao médico. Sua mãe dizia:

— “Você é minha melhor amiga.”

E ela sorria. Mas por dentro, só queria ser filha.

💬 Reflexão:

Isadora cresceu sem espaço para ser vulnerável. Sua infância foi consumida por um papel que nunca foi dela — o de mãe da própria mãe.

Esse é o retrato da filha parentalizada: aquela que, por necessidade, vira adulta cedo demais. Que carrega pesos invisíveis. Que cuida de todos, menos de si.